Frequentadores descrevem uma das rodas de sambas mais
antigas do Rio
Por Larissa Kurka
Pela rua Argemiro
Bulcão, no século XVIII e XIX, era comum ao final do dia se ver pelo chão sal
espalhado. Hoje, o que se vê
são pedaços de cascas de ovos coloridos e limão revelando que no dia anterior certamente houve no bairro da Gamboa, no Centro, o
tradicional samba da Pedra do Sal regado a caipirinha e o famoso rosinha.
Reduto do samba a Pedra do Sal antes era local de reunião
de estivadores que após ao trabalho se juntavam em volta dos sambistas para
relaxar e cantar. Também foi responsável por revelar grandes talentos como
Pixinguinha, Donga, Heitor dos Prazeres e João da Baiana.
O samba não morreu e atualmente tem seu encontro com os
amantes do ritmo às segundas e sextas-feiras. Pelas paredes se vê a afirmação
de uma história construída pelos negros e figuras tradicionais da nossa cultura
como o chamado malandro. Há artes retratando Cartola e exaltando o samba no
local. Assim como mulheres negras trajando roupas de baianas, fazendo
referência as que ajudaram a propagar o cadomblé, como a tia Ciata.
Eles retratam não só outra época, mas também o presente
com a contínua atividade de preservação de um dos ritmos responsável por uma
das identidades brasileiras, o samba.
Curioso por ser um local que atrai pessoas de todas as
classes sociais é considerado um espaço democrático.
Às sextas, é comum encontrar um engravatado por lá assim como pessoas que
procuram um ambiente agradável para curtir um bom samba e uma cerveja gelada,
como o ator Luiz Fernando Pinto descreve.
— Pelo menos uma vez ao mês, eu venho à Pedra do
Sal. Até porque trabalho perto e o lugar é superdemocrático. Não é lugar de
classe, frequenta todo mundo.
O local, que fica aos pés do Morro da Conceição, também
reúne os moradores que, apesar do barulho, dizem gostar do que veem na porta de
casa. Este é o caso do metalúrgico Jorge Santos, 50 anos, que mora no prédio
37, em frente à Pedra do Sal.
— Gosto
do samba. Quando vim morar aqui, a roda já existia. Então já sabia do barulho. Mas os
moradores gostam de participar e interagir com pessoas de todos os lugares do
Rio.
Ele conta que a prefeitura realiza o serviço de limpeza
normalmente e que os que moram no local não têm do que reclamar neste sentido.
Sambistas na Pedra do Sal. Foto: Riotur |
A enfermeira Ludmila Stefe diz que o diferencial da Pedra
do Sal é a presença de sambistas de outrora, do chamado samba de raiz.
— Gosto de lá por
tocar samba antigo de compositores como Cartola e Candeia. Além disso, é
frequentado por moradores antigos, que viveram esta época e muita gente que
pesquisa o samba. É um local onde se pode reconhecer a nossa história.
Mas Ludmila e seu amigo Luiz Paulo Neto, estudante de história, dizem que
apesar do lugar ser um dos poucos que costumam tocar o estilo no Rio, isso vem se perdendo nas noites de sexta-feira.
Muitas pessoas pedem sambas mais modernos, como os de Zeca Pagodinho, fugindo
um pouco dos cantores tradicionais.
— Essa geração nova não quer ouvir Clementina de Jesus. A
galera pede coisas mais novas e aí vai morrendo a tradição.
Para quem não sabe, Clementina foi uma cantora de samba
que começou sua carreira aos 62 anos. A idade avançada da empregada doméstica
não foi nenhum empecilho para o sucesso. O interessante foi que, além de cantar partido alto, Clementina recuperou
antigas canções africanas que estavam se perdendo, tais como o jongo e os
cantos de trabalho.
Outro ponto que incomoda Ludmila e Luiz Paulo é que a
quantidade de gente na Pedra do Sal. Como o espaço é pequeno fica difícil se
movimentar. É a opinião que também compartilha o morador Jorge Santos.
Apesar disso, eles reconhecem que o local ainda preserva
a sua essência às segundas-feiras. É um dos poucos lugares onde ainda se pode
encontrar o samba de raiz.
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