Cais do Valongo e Cais da Imperatriz são
revelados na Zona Portuária
Amanda Sorato
Escondidos por mais
de 160 anos sob alguns metros de pedra, o Cais do Valongo e o Cais da Imperatriz
foram revelados. Essas relíquias da época do Império estiveram por anos
escondidas e após insistência dos arqueólogos que buscavam trazer à tona estes
locais tão importantes para história do nosso país, foi permitida a escavação,
com a monitoração da prefeitura.
Ambos os Cais se
localizam no Centro da Cidade, mais precisamente na área que está em obras
graças ao projeto denominado Porto Maravilha, que busca a revitalização da Zona Portuária do Rio de Janeiro. Sempre se soube que ali ficava o Cais da
Imperatriz graças a um totem que representa a coroa portuguesa. Mas, ao começarem a escavar, os arqueólogos também encontraram o Cais do
Valongo, 60 centímetros abaixo do Cais da Imperatriz.
Os dois tipos de cais: o dos escravos e o da Imperatriz. Fotos Amanda Sorato |
Localizada entre as
ruas Coelho e Castro e Sacadura Cabral, a região do Valongo era o grande centro
de comércio de escravos do Rio de Janeiro. O Cais do Valongo funcionou de 1811
até 1831 e foi responsável pela entrada de mais de meio milhão de escravos no
Rio de Janeiro. A região contava também com os armazéns de vendas e
engorda de escravos, um local chamado Larazeto, onde os escravos doentes iam
para se curar e várias lojas que vendiam material de tortura para castigar os negros. No Cemitério dos Pretos Novos, perto dali, os
escravos eram enterrados à flor da terra. Ao ser descoberto dentro de uma casa
particular, o cemitério virou um instituto, o IPN, e atualmente está aberto para visitação.
O cais foi construído
pela Intendência Geral da Polícia da Corte da Cidade do Rio de Janeiro, por
determinação do Vice-Rei, o Marquês do Lavradio. Antes do Cais existir, os
escravos desembarcavam pela Rua Direita, atual Rua Primeiro de Março. Mas o
Marquês acreditava que escravos não deveriam desembarcar por uma das principais
ruas da cidade sob os olhares dos estrangeiros, que ficavam chocados com a cena de homens e mulheres sendo vendidos em praça pública.
Em 1843, a região
passa por uma grande transformação. Com a proibição do tráfico de escravos, o cais
é aterrado e reformado em um projeto do arquiteto francês Grandjean de Montigny
– que estava exilado no Brasil depois da queda de Napoleão. O projeto tinha
como objetivo esconder as ligações do Brasil com a escravidão. A obra também se
deu para receber a Imperatriz Teresa Cristina, que iria se casar com Dom Pedro
II. Além do Cais, a região do Valongo muda de nome e passa a se chamar de Rua
da Imperatriz. Para a nobre, foi feito um piso alinhado, mas para os escravos, servia a irregularidade das pedras.
Para o professor de
história da PUC-Rio Rômulo Matos, atualmente, o cais recupera o passado africano no Rio de
Janeiro que foi soterrado com a construção do Cais da Imperatriz. “A
importância é de se recuperar um passado que estava enterrado e com ele tudo que há no seu entorno. O lugar de desembarque não está sozinho, tem todo
um centro de memória africana ao seu redor.”
Após anos de
esquecimento, a região está agora aberta para visitação, com placas sinalizando
o lugar e explicando a sua importância histórica. Para o empresário Erick
Rangel, conhecer um lugar com tamanha importância é uma experiência
enriquecedora. “Poder visitar o antigo Cais do Valongo e ver, mesmo que em um
espaço pequeno, como o Rio foi um dia e comparar com hoje é um exercício
incrível. É muito bom poder ter um lugar na nossa cidade que exalte a cultura
africana.”
O Cais do Valongo faz
parte do Circuito Histórico e Arqueológico de Celebração da Herança Africana. Além
dele, o Instituto Pretos Novos, a Pedra do Sal, o Jardim do Valongo e o Largo
do Depósito fazem parte do roteiro estipulado pela prefeitura para visitação de
marcos históricos da memória da África na cidade.
Piso alinhado e não-alinhado: diferentes destinações |
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